sexta-feira, 25 de setembro de 2015

Um Tiro - P.R.Baptista

Hoje é um dia importante da vida brasileira.
Na novela Verdades Secretas de Alcyr Carrasco, Carolina ( Drica Moraes) encontra o marido Alex ( Rodrigo Lombardi) na cama com a filha Angel ( Camia Queiroz).
Como diz, intimamente já sabia do romance entre os dois mas não queria admitir.
Agora está vendo, não pode mais ignorar o que o país inteiro tinha conhecimento.
São os recursos da criação.
O leitor ( ou o espectador) frequentemente tem dos enredos um conhecimento que foge aos personagens.
Mas na novela, nesse momento, personagens e espectadores se encontram.
No penúltimo capítulo, o de ontem, Carolina toma um revólver (por isso nunca tenha um revólver ao alcance dentro de casa) e entra no quarto onde marido e filha estão abraçados.
Antes ainda tem tempo de ouvir ele dizer para a filha que a ama.
Com o revólver nas mãos, apontando ora para um lado , ora para o outro, parece escolher em quem vai atirar primeiro.
Ou se não vai atirar nos dois.
Numa novela que abordou duma vez só vários pontos que costumavam aparecer por partes, em doses muito medidas (prostituição, drogas, sexo, etc.) ficou destinado para o final , costurado ao longo de quase toda a novela, um tema que não era muito comum.
O incesto.
Embora Alex não seja pai biológico, seja seu padrasto, essa é a questão de fundo.
A traição dentro da família.
Hoje, portanto, a Rede Globo, aposta suas fichas numa grande audiência.
Como nossa Hollywood brasileira investe como tábua de salvação, à falta de jornalismo sério, numa programação que da tarde à noite apresenta novelas.
E no encerramento de Verdades Secretas aposta na direção da bala que vai ser disparada.
O tiro tem que ser certeiro.
Na mente do roteirista ele já foi dado.
Entre o elenco já se sabe quem vai ser atingido porque a cena já foi filmada.
O que deve ser,então, considerado é que do ponto de vista exatamente literário da criação a novela só pode ter um desfecho.
O castigo que Alex e Angel podem merecer não é a morte.
Deve ser uma pena que carreguem pelo resto da vida e para a qual não tenham perdão.
Devem portanto seguir vivos, cada um em seu canto, amargando sua condenação que é justamente de permanecerem vivos.
 O tiro deve, assim, retirar da cena quem não teria condições de suportar a revelação.
Não vejo necessidade, portanto, de ver o último capítulo para saber o desfecho.
Ele já é conhecido.

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