quinta-feira, 16 de julho de 2020

O MARCO LEGAL DO SANEAMENTO - Lúcio de Almeida Hecktheuer (*)


 O Projeto de Lei PL 4.162/2019, de autoria do Governo Federal, que atualiza o Marco Legal Regulatório do Saneamento Básico, teve sua tramitação na Câmara Federal e Senado Federal finalizada em 24 de junho de 2020. No dia seguinte a sua aprovação, foi enviado para sanção do Presidente da República fato este ocorrido no dia de hoje (15/07/2020). Este, agora Lei, substitui regramentos antigos que vinham sofrendo várias alterações pois suas imposições não eram cumpridas pelos governantes e, não sendo cumpridas, eram reformulados. Esse não cumprimento da legislação foi um dos fatores que contribuiu para a situação caótica com que se encontra o saneamento básico no Brasil, principalmente nas regiões Norte e Nordeste. De nada adianta termos legislações vigentes se não tivermos vontade política para cumpri-las.
O saneamento básico envolve as ações de tratamento e distribuição de água potável, coleta e tratamento de esgoto, resíduos sólidos (lixo) e drenagem de águas pluviais. O novo Marco Legal estipula metas a serem cumpridas pelos municípios num prazo de 13 anos, 5 meses e 17 dias (um total de 4.918 dias), ou seja, até 31 de dezembro de 2033. Dentre as principais metas temos o abastecimento de 99% da população com água potável, a coleta e tratamento de 90% do esgoto gerado nos municípios e a realização de ações que propiciem diminuir o desperdício de água, aproveitamento da água da chuva e melhorias nos processos de tratamento de água. Também é estimula a participação da iniciativa privada através da obrigação dos municípios em licitarem a concessão dos serviços de saneamento, licitações essas envolvendo empresas públicas e privadas. Referente aos lixões a céu aberto, seus prazos de extinção foram prorrogados de 2018 para 2021 nas capitais e regiões metropolitanas e de 2021 para 2024 em municípios com menos de 50 mil habitantes.
Segundo os diagnósticos de serviços de água e esgoto e de resíduos sólidos publicados em dezembro de 2019 pela Secretaria Nacional de Saneamento, vinculada ao Ministério do Desenvolvimento Regional temos informações importantes sobre saneamento em níveis locais, regionais e nacional, entre elas:
- Dos 5.570 municípios do país, 5.166 (92,7% do total) tem serviços de distribuição de água potável e 2.530 municípios (45,4% do total) com serviços de coleta e tratamento de esgoto;
- O percentual de atuação de empresas privadas nos serviços de água e esgoto atualmente é de apenas 6,7%;
- 83,6% da população brasileira é atendida com serviços de abastecimento de água (169.085.425 habitantes) e 53,2% com os serviços de esgoto (107.480.164 habitantes);
- O índice de perdas de água potável na sua distribuição é de 38,5% no Brasil, ou seja, 38,5% da água potável disponibilizada não é contabilizada como volume utilizado pelos consumidores;
- Nas despesas de exploração dos serviços de água e esgoto, o principal gasto é com pessoal e serviços de terceiros equivalente a 60,4% do total da despesa; os gastos com produtos químicos são menores que 4% e com energia elétrica 14,5%;
- Do total de resíduos sólidos gerados anualmente, 24,4% destes ainda são depositados em unidades de disposição final inadequadas.
A Tab. 1 mostra a média de alguns indicadores de desempenho do país, da região sudeste onde os serviços de saneamento são os melhores e do Serviço Autônomo de Saneamento de Pelotas (SANEP) empresa pública responsável pela prestação de serviços de saneamento em Pelotas.
 Tabela 1 – Indicadores de saneamento no Brasil
Como pode-se perceber, o SANEP atende com serviços de abastecimento de água 99,42 % da população pelotense e com serviços de esgoto 59,44% da população, serviço este que pode ser melhorado quando comparado com o percentual da região sudeste. Mesma atenção deve ser dada no que se refere as perdas de água na sua distribuição e com os gastos elevados relativos a pagamento de pessoal e de serviços de terceiros, gastos estes superiores aos das médias nacional.
Observando mais detalhadamente a evolução dos indicadores de desempenho do SANEP ao longo dos últimos 13 anos (de 2006 a 2018), apresentados na Tab. 2, observa-se uma certa estagnação sinalizando que, com o novo marco do saneamento básico, a empresa terá que realizar investimentos mais vultosos para alcançar as metas estabelecidas para dezembro de 2033, ou seja, daqui a 13 anos. Os indicadores atuais (ano de 2018) de esgoto coletado, esgota tratado, perdas de água na sua distribuição, percentual da população atendida com serviços de esgoto, extensão de rede de esgoto e gastos com pessoal são muito parecidos com os de 2006.

Tabela 2 – Evolução dos indicadores de saneamento do SANEP


Referente aos resíduos sólidos em Pelotas, responsabilidade do SANEP, o mesmo vem, de longa data, terceirizando o serviço através de licitações para empresas privadas com um custo médio mensal superior a R$900.000,00 (novecentos mil reais) relativo a coleta, transbordo, transporte e deposição em aterro sanitário. Pelotas, em média, gera expressivas 8.000 toneladas de lixo por mês. Cabe lembrar que Pelotas não tem aterro sanitário próprio.
Diante do exposto, esperamos que esse novo marco regulatório do saneamento básico, agora vigente, seja fonte de inspiração para nossos governantes tomarem as devidas decisões a fim de que, em 2033, tenhamos alcançado a universalização dos serviços de água e esgoto e a extinção total dos lixões.
(*) Professor do IFSul , Doutor em Engenharia ( UFRGS)

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