domingo, 24 de abril de 2016

Elogio às coisa inúteis - Manoel Magalhães


Gostaria de fazer um elogio à inutilidade. Em desafio a esta época que evoca o pragmatismo, a eficiência sobre todas as coisas. Parece-me que parar e adorar as coisas inúteis tornou-se contraproducente, atentado a ordem que nos escraviza desde o primeiro vagido ao derradeiro suspiro. 


Houve época em que obedeci a este absolutismo escravizador, cujo intento é arrancar nossa alma e pendurá-la num varal a cotejar sangue. Com o passar dos anos, em processo de autoconhecimento, fui percebendo o valor das coisas inúteis. Não tem dinheiro que pague o ócio criativo. 


Perambular de quando em quando entregue à abstração, dando à alma a liberdade que ela precisa (e merece!) para poder atingir paragens inconcebíveis para quem se entregou ao pragmatismo castrador. 


Nesta segunda-feira pela manhã, ao abrir a janela da casa e me deparar com a luz do dia, fui tomado pelo impulso das coisas inúteis. Lembrei-me do poeta Manoel de Barros e de suas palavras: “Passava os dias ali, quieto, no meio das coisas miúdas. E me encantei”. As coisas miúdas se referem às inutilidades... 


Coisas que na acepção dos eficientes é perda de tempo. Na minha concepção, diante da grandeza do nada fazer, conquista-se ainda mais tempo. Os segundos, os minutos, as horas, os dias se alargam, e diante desta liberdade toda a alma agradece. 


Depois de fazer um elogio à inutilidade, paro à frente do cavalete e o mundo que eu imaginei quando estava entregue à preguiça, irrompe cheio de luz e colorido. E constato nesta prática de algo que sempre desconfiei. O artista é um inútil por vocação. Por isso cria.

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