segunda-feira, 24 de junho de 2019

O BRASIL FORA DOS BRICS - André Motta Araújo


Todos os nomes que estão sendo hoje circulados para representar o Brasil tem fortes ligações com os EUA, o que deverá ser muito mal visto pelos demais países sócios do Banco, razão pela qual podem provocar alguma manobra para tirar a vez do Brasil, que deveria ter a próxima Presidência.

O grupo de grandes países emergentes que tem 40% da população mundial é uma realidade geopolítica, hoje consubstanciada no New Development Bank, o banco dos BRICS, com sede em Shangai, cuja próxima Presidência DEVERIA ser do Brasil, mas provavelmente não será. O Brasil foi fundador entusiasta do Banco dos Brics e tinha lá como seu representante e diretor um nome de alto prestígio, o economista Paulo Nogueira Baptista Jr., que tinha sido o diretor brasileiro do Fundo Monetário Internacional por muitos anos.

Nogueira Baptista foi afastado de seu cargo pelo governo brasileiro, sendo sem dúvida o mais experiente nome para esse cargo, dada sua longa experiência em instituições financeiras multilaterais.

Todos os nomes que estão sendo hoje circulados para representar o Brasil tem fortes ligações com os EUA, o que deverá ser muito mal visto pelos demais países sócios do Banco, razão pela qual podem provocar alguma manobra para tirar a vez do Brasil, que deveria ter a próxima Presidência. Para os demais sócios não teria sentido ter na Presidência um quinta-coluna de Washington, dado que o banco foi criado exatamente para não estar sob a influência dos EUA, em contraposição ao Banco Mundial.

O Brasil simplesmente se afastou neste novo governo, de forma ostensiva, desagradável, estridente, ilógica, pouco inteligente e nada diplomática do conceito geopolítico que embasa esse bloco de países, cuja base é se opor a pretensão imperial dos Estados Unidos em política externa.

Não é um enfrentamento direto, é uma disputa por áreas de influência no mundo, considerando que os EUA pretendem continuar a exercer um modelo que ao fim do dia traz mais problemas que soluções às relações internacionais. O consenso evidente do conceito BRICS é que seus componentes, Brasil, Russia, Índia, China e África do Sul, tenham, no mínimo, uma política externa INDEPENDENTE daquela que é a linha imperial dos Estados Unidos. Um alinhamento a Washington automaticamente desqualifica um País a pertencer ao bloco.

Ora, a postura do atual governo, se oferecendo, sem que isso tivesse sequer sido sugerido pelos americanos, como alinhado total de Washington, mais do que isso, à Administração Trump, malvista no mundo inteiro, da União Europeia à Ásia e com um único aliado automático, Israel, tira o Brasil da lógica do bloco BRICS, é uma evidência óbvia, de consequência geopolítica.

Na próxima reunião do G-20, em Osaka, no Japão, haverá uma reunião paralela dos BRICS, para a qual o Brasil não deve ser convidado. A atitude nem sequer é hostil, é apenas lógica. Se nessa reunião se tratar de discussões sobre a situação mundial, onde existem conflitos, onde de um lado estão Russia, China e Índia, como no caso da guerra comercial e de outro estão os EUA, como confiar na mesa em um parceiro que é alinhado absoluto de Washington?

Os EUA são o passado e não o futuro. A posição relativa dos EUA no arranjo econômico mundial é decrescente há décadas. Em 1945 os EUA tinham 51% do PIB mundial, hoje tem em torno de 26%, a queda foi de lento decréscimo e continua. China e Índia crescem suas economias a um ritmo de 6 a 7% ao ano, enquanto a economia americana cresce em torno de 3 a 3,5% nos bons anos, o que matematicamente aumenta o “gap” a cada década, tudo isso sem falar em uma guerra comercial dos EUA com a China, o México e a União Europeia, que está apenas começando e aumentará a divergência entre os blocos.

Ora, o Brasil se alinhar à potência decrescente é um contrassenso, ainda mais porque a China é o maior comprador de exportações brasileiras, enquanto os EUA são concorrentes do Brasil no mercado mundial, o que aumenta o contrassenso. Mais ainda, os EUA não são aliados do Brasil em tudo, embora o Brasil deseje essa posição, o Brasil SE ofereceu como aliado sem condições, inclusive isentando de vistos cidadãos americanos SEM reciprocidade, uma situação simbolicamente humilhante, como a dos passageiros dos antigos navios de luxo, onde os passageiros de 1ª classe podiam ir à 2ª classe procurar namoradas mas os da 2ª classe não tinham acesso à 1ª classe, uma postura de inferioridade explícita e que diminui um País, sua autoestima e seu prestígio.

Não é preciso dizer que a situação diplomática do Brasil hoje é de ISOLAMENTO. Não subiu de categoria junto à Washington, que não deu até agora vantagem alguma em contrapartida à oferta unilateral de aliança do Brasil e, por outro lado, o Brasil perde lugar à mesa dos BRICS, cai de categoria como potência média e de grande País emergente. Junto à União Europeia perde a extraordinária e valiosa posição de potência ecológica respeitada, ao rejeitar os acordos climáticos que eram, por excelência, área de influência e controle do Brasil. Ai se completa o isolamento geopolítico e diplomático procurado, enquanto que no Oriente Médio o Brasil perde o seu antigo papel, posição e prestígio junto ao bloco árabe, grande cliente dos produtos brasileiros por se oferecer, sem que tivesse sido solicitado, em aliança com Israel, país carente mundialmente de aliados, com exceção única dos EUA e que pouco ou nada representa para os interesses e comércio exterior brasileiro.

Quanto a uma suposta disponibilidade tecnológica de Israel para o Brasil, NÃO é preciso nenhuma aliança, basta ter dinheiro para comprar, Israel vende sua tecnologia para quem puder pagar, sem restrições.

O isolamento geopolítico do Brasil está apenas começando, a tendência natural é de aumento, diplomacia é geralmente área de movimentos lentos e atrás das cortinas, as costuras são imperceptíveis a olhos nus, quando o Brasil se der conta seremos párias mundiais, nos darão um resto de conforto à exportação de alimentos mas ai também  há o risco de retrocessos por causa de questões de “selo verde” e alianças erradas.

E pensar que a diplomacia brasileira já foi das mais prestigiadas do mundo, pelo seu equilíbrio e bom senso, alianças sutis e vantajosas, parceira da paz.

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