quarta-feira, 3 de outubro de 2018

GOVERNAR O BRASIL SEM O PT - Jorge Eremites de Oliveira


No debate entre presidenciáveis promovido pelo SBT, no dia 26/09/2018, Ciro Gomes, candidato à presidência da república pelo PDT, disse que se puder prefere governar o país sem o PT. Isso significa administrar o Brasil sem se valer do modus operandi ou habitus do establishment petista, aqui entendido como núcleo duro ou cúpula do Partido dos Trabalhadores.
​Na minha opinião, como etnógrafo que por cerca de vinte anos esteve a observar a legenda, administrar sem o referido establishment é possível, sim. Não obstante a esta ideia, não se pode negar que na legenda há nomes importantes que não estão envolvidos em escândalos de corrupção, como Eduardo Suplicy e Olívio Dutra, respectivamente de São Paulo e do Rio Grande do Sul. No próprio MDB há nomes de respeito, como Roberto Requião, senador pelo estado do Paraná, não envolvido no golpe de 2016. A questão central reside em não deixar que uma coligação, eleita para um mandado de quatro anos, possa ser confundida com o próprio Estado e venha a usar da confiança recebida nas urnas para implementar projetos hegemônicos de poder. A população não mais deseja ver o governo federal envolvido em escândalos de todo tipo: a) denúncias de licitações fraudulentas e malversação do dinheiro público; b) compra da governabilidade por meio de petrolões e outros esquemas espúrios análogos aos mensalões; c) gastos exorbitantes com obras faraônicas e desconexas de um projeto nacional de desenvolvimento, como a construção de arenas em lugares onde estádios desse tipo fazem pouco sentido e oneram os cofres públicos, o que foi feito em detrimento do completo abandono de nossos museus; d) destinação de bilhões do BNDES para beneficiar aliados de última hora, incluindo certo governo desastroso na América do Sul; e) esquemas de caixa dois para financiar campanhas eleitorais e outras coisas; f) compra da refinaria de Pasadena, nos Estados Unidos, sem a conclusão da construção de refinarias de petróleo e outras obras no país; etc.
​Neste momento, o retorno do PT à Presidência da República significa atraso na medida em que não possui um projeto nacional de desenvolvimento (a legenda, aliás, não é nacionalista) e, portanto, não planeja o país para o médio e o longo prazos a partir de possíveis macrocenários políticos e econômicos. Apesar disso tudo, segue a manter alianças estapafúrdias com vários golpistas que atuaram para alijar a presidenta Dilma Rousseff do poder, em 2016. “Não vai ter golpe” e “impeachment meus ovos”, retrucavam nas redes sociais; “Foi golpe, sim”, dissemos amiúde. Mesmo assim, o PT e sua cúpula mostram-se incapazes de promover qualquer autocrítica, ainda que intelectuais como Noam Chomsky tenham vindo à público chamar a atenção para a questão.
​Nesta linha de argumentação, vale lembrar que o PT e o PSDB são, de fato, cabeças de uma mesma serpente, como aponta Mangabeira Unger, e o Brasil não mais aguenta o binarismo maniqueísta nascido no Sudeste. Ambos os partidos costumam implementar gestões neoliberais e antinacionais, com uma diferença básica para o campo progressista: o PT promove a alienação das massas e até mesmo de certa intelectualidade, que se apresenta como “cavalo de santo”, tornando-se a esquerda que a direita gosta, como diria Darcy Ribeiro. Costuma cacarejar para a Senzala e a Aldeia, mas bota os ovos na Casa Grande, parafraseando aqui Leonel Brizola e me inspirando em Gilberto Freire.
​Esse pessoal permaneceu por longuíssimos 14 anos no planalto central, à frente de uma coligação plural de partidos políticos (da qual o PDT fez parte e tem promovido certa autocrítica), e não promoveu as reformas estruturantes de que tanto o Brasil precisa. O que Lula, o ex-presidente encarcerado, fez de bom com uma mão (e fez muito, como verificado no Nordeste e em outras regiões), praticamente desfez com a outra ao indicar uma pessoa sem a necessária experiência para substituí-lo. Por qual motivo não indicou, por exemplo, Tarso Genro, ex-prefeito de Porto Alegre, ex-ministro e ex-governador do Rio Grande do Sul para a presidência da república? Ora, desde fins do século passado que Tarso percebia o PT gaúcho como bolchevique, ao passo que asseverava que o PT paulista seria menchevique. Além disso, não faz parte do establishment que desviou o partido para outros caminhos a partir da segunda metade dos anos 1990. Por que ele mesmo, Lula, não foi candidato em 2014, haja vista que sabia que aquela eleição presidencial seria marcada pela polarização e à época estava em curso um verdadeiro estelionato eleitoral, com graves consequências para a nação? Não fez isso porque é um articulador pragmático, desde os tempos de sindicalista, a ponto de colocar o projeto hegemônico do establishment que lidera à frente dos interesses nacionais.
​A turma mais sectária do ex-presidente costuma chamar seus desafetos de “direita”, “coxinhas”, “reacionários”, “neoliberais”, “fascistas” etc., mas não é capaz de olhar para o próprio umbigo. Alimenta a polarização com o movimento nazifascista, nutrido pelo antipetismo e representado pela candidatura do inominável e seu “jumento de carga"; brinca de fazer cavalinho de pau no precipício, correndo o risco de jogar o Brasil num abismo profundo.
​Penso ainda que de pouco adianta dizer #EleNão para apenas um candidato, como se o establishment petista (Dilma, Gleisi, Cardozo e outros) não tenha as mãos sujas do sangue de mulheres Guarani e Kaiowá violentadas, torturadas e assassinadas em Mato Grosso do Sul, apenas para citar um exemplo pontual que conheço muito bem como pesquisador. O PT no poder é, sim, anti-indígena e implementa uma política indigenista de natureza genocida, algo que o PDT de Brizola, Darcy e Juruna jamais poderá fazer, sob pena de entrar em profunda contradição. Nesta reta final do primeiro turno das eleições, o mais coerente é bradarmos #ElesNão e escolhermos um nome para votar pelas propostas que defende e sua história de vida pública.
​Neste sentido, vale registrar o que diz a cantora Alcione, a famosa Marrom, sobre Ciro Gomes. Para ela, o candidato trabalhista possui as seguintes qualidades: 1) inteligência (chega de votarmos em idiotas e estúpidos que pensam poder resolver problemas complexos a base de clichês e jargões); 2) experiência (foi prefeito de Fortaleza, governador do Ceará, ministro nos governos Itamar Franco e Lula, deputado estadual, deputado federal, secretário de estado de saúde etc., e nunca respondeu por um mal feito à frente desses cargos); 3) amor pelo Brasil (nacionalismo é bom e não pode ser reduzido à ideia de xenofobia ou de homogeneização cultural, mas percebido como sentimento de pertença, orgulho de ser o que somos e postura em defesa da soberania do país); 4) energia (determinação e disposição para governar, e bem, com uma equipe de notáveis, isto é, pessoas que tenham capacidade técnica, científica e administrativa e saibam articular, defender e implementar projetos voltados ao desenvolvimento econômico com sustentabilidade e inclusão social).
​Por tudo isso e outras tantas razões, percebo em Ciro Ferreira Gomes o melhor candidato à presidente da República Federativa do Brasil. Quando o vejo falar em público, relembro do saudoso Brizola e penso assim: Até a vitória trabalhista, sempre!

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