quarta-feira, 11 de março de 2015

Cronistas em dias tensos


Nei Alberto Pies



"O silêncio arquiteta planos que não são compartilhados. Quando nada é dito, nada fica combinado". (Martha Medeiros)

Mais do que nunca, em tempos revoltos, a realidade é que se impõe aos que escrevem.
 Os cronistas, especialistas em retratar o cotidiano reflexivamente, vêem a realidade superando as suas inspirações. 
Quando a realidade lhes exige opiniões e posicionamentos, obrigam-se a tomar partido: dizer a parte (ou lado) que defendem. 
Precisam externar seus pontos de vista.
Aparentes insignificâncias cedem lugar a temas mais duros e complexos, mais difíceis. 
Mas para a crônica, nada é tão insignificante que não mereça ser apreciado e traduzido para reflexão. 
Reflexão, por sua vez, significa pensar a ação humana, em todas as suas dimensões.
Cronistas vivem dias tensos. 
As crônicas, que emergem do cotidiano, obrigam a posicionar-se. 
Há uma fartura de pautas no atual momento histórico brasileiro: corrupção, descrédito dos políticos, fundamentalismos religiosos e políticos, manifestações de rua, crises na saúde e na educação, falta de diálogo e consensos sobre os destinos do país, juventudes que desafiam os adultos, drogas, ética na política, esperanças desperdiçadas, inércia dos governos, crise mundial, ...
Nestas horas cronistas assumem também uma cidadania ativa. 
Vivem, como todos os brasileiros, um momento de livre manifestação, de confronto acirrado de ideias, de consolidação da democracia. 
Mas em tempos em que nossas instituições estão fortalecidas, funcionando com independência e autonomia e sem afrontas. 
As instituições e poderes da República que alicerçam nossa democracia, felizmente, estão acima das pessoas.
O que falta ao Brasil é um pacto para não paralisarmos nem a economia, nem a produção e nem a política brasileira. 
 Serve a quem paralisar o país?
Neste contexto de crises generalizadas, o bom senso e a governabilidade devem nortear a cabeça de nossos governantes, juízes, lideranças, parlamentares e líderes religiosos. 
O mesmo bom senso recomenda a quem se manifesta e se organiza nas ruas ou nas redes sociais que não use de violência e nem apele para baixarias ou insultos. 
O bom senso, também recomendado a todos nós.
Acredito que palavras tem grande poder de jogar luzes à compreensão de nossa realidade. Associo-me ao pensamento de Martin Luther King que disse em vida: "eu também sou vítima de sonhos adiados, de esperanças dilaceradas, mas, apesar disso, eu ainda tenho um sonho, porque a gente não pode desistir da vida". 
Sim, porque vida é luta. 
E lutar é imprescindível para quem deseja viver melhor.
Tenho lado. 
Milito com aqueles que, desde sempre, lutaram e conquistaram direitos e dignidade para viver. 
Estes mesmos, nem sempre compreendidos, souberam organizar bravamente suas lutas ao longo de nossa história. 
Não são manifestantes oportunistas e sabem o que está em jogo nas recentes e ditas "novas manifestações" do ano 2015.

(*) Nei Alberto Pies, professor e ativista de direitos humanos.


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