Wanúbia Lima
Faz tempo
que o mal do século deixou de ser a tuberculose, o romantismo ou a solidão. Na
correria cotidiana, o grande desafio da humanidade está na necessidade de
superar o tic tac do relógio.
A impressão
é que todos os dias começam e terminam turbulentos, acompanhados pelo estresse
- principal vilão. O acúmulo de atividades é confundido com responsabilidade,
comprometimento, produtividade e eficiência.
A competitividade no trabalho, os engarrafamentos no trânsito, poluição,
ansiedade e noites mal dormidas desenham a realidade do século XXI. Àqueles que
não ultrapassam o tempo que foge são comumente vistos como preguiçosos. ‘Não te
faltou tempo, faltou interesse’, grita a voz da consciência moderna.
O corpo e a mente parecem
habilitados a suportar as pressões que se manifestam contra a pausa, contra o
respiro aliviado, em busca da construção contínua de mecanismos que gerenciem o
tempo, com a finalidade de se obter mais tempo, para então executar novas
tarefas, de modo sistêmico.
A cura sintética para quase todos os
males encontra-se à venda, em qualquer farmácia de plantão. Cápsulas para azia,
gastrite, gripe, dor de garganta, cólica, alergia, insônia, apatia e depressão.
No noticiário, há pouca variação.
Aumento do dólar, queda nas principais bolsas de valores do mundo, sequestros,
assaltos, corrupção. Ataque terrorista aqui, terremoto ali. E para descontrair,
o placar do futebol, que pouca diferença faz para os olhos passivos, adequados
ao padrão.
E por falar em padrão, perde-se no mundo
a riqueza do que é plural. Nas ruas, as mulheres usam o mesmo corte de cabelo,
o mesmo batom, o mesmo sapato... igualzinho ao da protagonista da novela. Já os
homens, estes anseiam os mesmos carros, os mesmos cargos, os mesmo pratos na
hora do almoço.
O amor virtual está ao alcance de
todos. Profundidade e comprometimento são coisas do passado. Muita gente já não
se ama para casar, nem tem interesse em casar para amar. As relações parecem
voláteis, breves como bolhas de sabão.
Levantamos sonâmbulos, dia após dia
na hora certa, em um ritual que privilegia a pontualidade, mas que ignora o
despertar para uma vida que vá além da superficialidade.
As prateleiras dos mercados são
decoradas com enlatados, congelados, embutidos. Milho transgênico, soja transgênica,
refrigerantes, sucos em pó. O artificial seduz. Nas ruas pouquíssima coisa
alimenta a curiosidade.
Nas redes sociais, mil e duzentos amigos. Na vida cotidiana, o
isolamento é glacial. O vizinho se
intimida ao mesmo tempo em que se irrita quando ouve do outro um simples “bom
dia”. Não há tempo a perder, nem tempo para responder. Atrasados, todos correm
contra as horas.
No cenário moderno, lazer significa consumo. Quanto maior o preço, maior é o gozo social. Carros importados,
viagens internacionais, TVs de Plasma, aparelhos eletrônicos. Uma saga onde é
preciso ter para ser.
E bem embaixo de qualquer nariz, lá estão meninos e meninos de rua.
Velhos, pródigos e mendigos. Entre a fumaça dos carros e o cheiro de gasolina,
pretos e pobres vendem balas no semáforo, ao mesmo tempo em que provocam terror
e pânico em quem os assiste, de longe.
E assim caminha a
humanidade, anestesiada, autômata, em uma sociedade onde a velocidade dos acontecimentos impõe um ritmo de
vida que desafia o cronômetro.
Tempos modernos.
Um comentário:
Ótimo texto!
Só n tenho tempo para comentar...
Positividade Sempre!!!
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