por Paulo Afonso Rheingantz
Instituído pela Lei 5001/2003 o CONPLAD deveria ser o órgão colegiado fiscalizador e normativo e a principal instância de consulta do Poder Público para a gestão da política urbanística do Município. Suas atribuições englobam o controle e proteção da qualidade do espaço municipal, deliberar sobre a aplicação de diretrizes da política urbanística executada pelo Poder Público Municipal, assegurar a proteção, preservação e melhorias da qualidade de vida no Município, opinar sobre a realização de Estudo de Impacto de Vizinhança para obras e atividades, incentivar atividades que proporcionem a sustentabilidade do uso e ocupação do espaço municipal e, sempre que necessário, organizar plenárias e audiências públicas para a discussão de projetos e diretrizes do poder público.
Por natureza, órgãos colegiados por representação deveriam operar em um processo recursivo e recorrente de reflexão, discussão e proposição de políticas e ações relacionadas com a qualidade de vida e com a gestão da política urbanística do Município.
Por princípio, os membros representantes deveriam apresentar e discutir com seus pares as proposições e decisões de seus representados cuidando para não sobrepor ou privilegiar os interesses setoriais aos que são públicos. Por sua composição é natural e compreensível que suas reuniões, que são públicas, sejam permeadas por discussões e até mesmo embates em torno dos interesses setoriais.
Por dever de ofício, deliberações que impactam a sustentabilidade do uso e a ocupação do espaço municipal, deveriam ser precedidas de plenárias e audiências públicas organizadas para sua mais ampla discussão. Toda comunidade pelotense deveria ser informada sobre os impactos ambientais e na vida urbana que serão produzidos a partir das mudanças propostas.
Mas esta não tem sido a prática corrente no processo de revisão do texto da lei 5502/2008 – III Plano Diretor de Pelotas (III PDP), com vistas a corrigir erros de digitação e a eliminar ambiguidades que dificultam sua operacionalização por parte das instâncias técnicas do Poder Municipal.
Diferentemente do que fora acordado – as entidades representadas deveriam analisar e discutir documento-base reparado pela Secretaria Municipal de Gestão da Cidade e Mobilidade de modo a instruir seus representantes no CONPLAD nos encaminhamentos e votações – estão sendo aprovadas alterações oportunistas e desprovidas dos necessários estudos de impactos de vizinhança. A ponto das duas universidades representadas, a UFPel e a UCPel retirarem suas representações, entendendo que o CONPLAD estaria descumprindo acordo previamente estabelecido, aprovando alterações sem discutir, em audiências públicas, os reflexos na paisagem e na qualidade de vida de toda a comunidade pelotense; alterações que não estavam contempladas no documento-base de discussão e que não se "limitam às adequações à Norma de Desempenho NBR 15.575" como afirma a matéria "Conplad: Sinduscon defende legitimidade do Conselho" publicada neste jornal na edição de 7 de setembro de 2016. Diferentemente do que sugere o item 3 da mesma matéria – "as alterações do Plano Diretor votadas até o momento não aumentam, sob nenhum aspecto, o Potencial Construtivo da cidade" – até mesmo os paralelepípedos das ruas e os ladrilhos hidráulicos das calçadas de Pelotas sabem que a proposta aprovada, ao duplicar a altura dos edifícios da Avenida Domingos de Almeida, impacta diretamente a sustentabilidade, a qualidade da paisagem, a mobilidade urbana e as redes de infraestrutura.
O que está em jogo são interesses setoriais que se sobrepõe aos públicos, em flagrante desvirtuamento das funções técnicas e, principalmente, éticas, de um Conselho que, acima de tudo, deveria aconselhar o Poder Público e zelar pela qualidade de vida do Município.
Curiosamente a naturalização dos discursos desenvolvimentista e empreendedorista não considera nem relaciona questões importantes como a drástica redução do crescimento populacional, ou a generosa – e, para alguns, irresponsável – extensão dos limites da área urbana de Pelotas com o excedente de oferta de lotes urbanos e de habitações para as classes média e alta – estudos do Núcleo de Arquitetura e Urbanismo da UFPel indicam que o déficit habitacional de Pelotas é restrito às famílias com renda entre 1 a 3 salários mínimos, que não são atendidas pelo mercado.
Caso as modificações que possibilitam a verticalização e a densificação urbana venham a ser transformadas em projeto de lei pelo Poder Executivo a ser votado pela Câmara de Vereadores, estaremos diante de um paradoxo: a quem interessa verticalizar uma cidade sem avaliar e ponderar sobre seus impactos na malha viária e na infraestrutura urbana nem apresentar argumentos que fundamentam as alterações que estão sendo aprovadas com surpreendente velocidade e discutível legitimidade por um grupo de conselheiros que confunde o bem comum com interesses setoriais?
Se aprovadas essas mudanças, a gestão urbana de Pelotas corre sérios riscos de seguir na contramão das políticas e práticas de mobilidade, vitalidade e gestão democrática da cidade. Previsivelmente a paisagem urbana da avenida Domingos de Almeida será desfigurada com a construção de meia dúzia de edifícios altos que devem ser ocupados por famílias que devem desocupar imóveis existentes, ampliando de forma preocupante a quantidade de edifícios abandonados ou parcialmente ocupados. No andar da carruagem, é provável que em breve estas alterações sejam estendidas a outras artérias da cidade, como as Avenidas Duque de Caxias e Fernando Osório.
A quem interessam as decisões que estão sendo aprovadas pelo CONPLAD?
A quem interessa essa herança?
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