O jornal impresso sempre cumpriu muitas funções, sobretudo nas pequenas comunidades gaúchas. Os imigrantes alemães e italianos sempre valorizaram os jornais que eram impressos nos idiomas deles. Os alemães assinavam o jornal St. Paulus-Blattt, impresso em alemão, lido e discutido entre – os letrados e interessados –, os quais, geralmente, eram lideranças das comunidades. Também assinavam o calendário, na forma de livro, denominado Ignatiuskalender. O mesmo era impresso em Porto Alegre e sob responsabilidade dos Padres Jesuítas. Os imigrantes italianos, por sua vez, recebiam em suas comunidades o Jornal Correio Rio-grandense, editado a partir de 1909. Depois das celebrações dominicais, os principais títulos eram lidos para todos. Havia também havia assinaturas que eram feitas pelas famílias, diríamos mais abastadas, ou interessadas.
Tais jornais eram uma das poucas fontes de informação que eram geradas de fora dos contextos das comunidades do interior. Quando apareceu o rádio, o veículo praticamente tomou o lugar das informações, antes restrita aos jornais e aos relatos dos viajantes. O fato é que todo o jornal que era entregue na forma de assinatura, ou distribuído gratuitamente pelas prefeituras, sindicatos ou outras organizações, sempre despertava uma grande curiosidade na comunidade, principalmente por ser uma informação palpável (ilustrada com fotos, charges, pinturas a nanquim e noutras linguagens, com informações gerais e locais, que vinham ao encontro dos desafios comunitários, da organização e da produção escrita das próprias comunidades). Tudo o que vinha escrito era aceito como verdadeiro, a exemplo de outros impressos como a Bíblia, dos folhetos da celebração dominical e do livro de cantos, geralmente folclóricos e religiosos.
O jornal também cumpria funções práticas como embrulhar produtos alimentícios e frágeis, sobretudos nos bolichos, casas de comércio ou supermercados. Ao chegar nas famílias, na forma de embrulhos, os jornais cumpriam a função de informar seus leitores. Particularmente, eu era obstinado por jornais, justamente porque continham informações novas e diferentes, nem sempre muito compreensíveis ao meu entendimento. Justamente por isso, eu fui assíduo leitor dos jornais amassados, antes dos mesmos cumprirem sua última missão: acender o fogo do fogão à lenha.
Até hoje, nas comunidades do interior, o destino final do jornal, após a leitura, vai à caixa de lenha. Nas cidades, destinam-se à reciclagem, ou para cães, gatos e aves preservarem a higiene da casa. Nos centros urbanos, entopem bueiros ou servem para proteger do frio quem mora na rua. Mas mesmo antes de seu destino derradeiro, o jornal impresso ainda está disponível para cumprir função de informar e instigar curiosidades pelo mundo desconhecido.
Avalio como mágico, poderoso e instigante o poder e a influência dos jornais impressos nas pequenas comunidades. Acreditando neste poder, dez anos atrás, ajudei a construir um jornal impresso de uma rede municipal de ensino de um município do norte gaúcho com predominância de comunidades no interior. Chamava-se "Criando para encantar". Era uma publicação da Secretaria Municipal de Educação. O objetivo era contar as práticas educativas de cada escola. Em pouco tempo, tornou-se o Jornal de toda comunidade, distribuído a todas as famílias daquele município, tornando-se logo referência de informação à comunidade. Deixou de ser impresso porque dava muito trabalho.
Hoje, associo-me a jornais e revistas, impressos e virtuais, que têm como missão integrar as comunidades pelo caminho da informação. Produzir informação e jornalismo com responsabilidade social é uma das características que justificam a existência de jornais impressos, contanto que as informações neles contidos não sejam instrumentos de dominação, mas que sirvam para democratizar o conhecimento nas comunidades.
Nei Alberto Pies, professor, escritor e ativista de direitos humanos
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