João Carlos Rodrigues
Vamos recapitular. A cantora paulistana Fabiana Cozza desistiu de interpretar a compositora Ivone Lara no espetáculo teatral “Um sorriso negro” devido a pressões de militantes do movimento negro de que não seria “suficientemente negra” para o papel. Fabiana é mulata clara (filha de um negro com uma branca) mas se considera negra, pelo menos se considerava até os últimos dias. Mas aprendeu e com ela nós também de que não é considerada por quem se julga porta-voz dessa comunidade. E agora? Se o(s) movimento(s) consideram todos os pardos negros para fins estatísticos, ignorando a miscigenação e adotando o conceito racista (do apartheid sul-africano e do Alabama) que uma gota de sangue negro faz um cidadão negro – então não há argumento para atacar Fabiana: ela seria negra. Não pode ser negra para algumas coisas e não para outras. Detectamos então o preconceito racial dentro de um movimento que se pretende contra o racismo. Coisa feia. Na verdade, como disse acima, Fabiana é mulata, pode ser afrodescendente (em parte) mas não é negra. Isso entretanto não a desqualifica para interpretar Dona Ivone, já que escolhida pela família da homenageada, de quem foi amiga e seguidora, pois é ótima sambista. Teatro é ilusão, não é documentário. O responsável pelo espetáculo (Jô Santana), que havia escolhido Fabiana, agora já acha que a militância tem razão. Que feio. Pensasse nisso antes. Vexame. A que ponto chegamos. Aqui minha solidariedade a Fabiana e à família de Dona Ivone. E que lastimável a posição do diretor e dos militantes! É necessário que a classe artística se manifeste sobre o assunto antes que se torne uma bola de neve incontrolável. Racismo não. Nem lá nem cá. E estamos conversados.
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